sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Capítulo III (E)


Ocultei a resposta num beijo enternecedor e por ali ficamos mais um bocado a viver aqueles momentos de namoro. O apelo aos sentidos, o aconchego que sentia era uma verdadeira novidade para mim que nunca tivera um namorado. Numa vida rodeada de números, reuniões, e projectos numa azáfama diária deu lugar a este repouso dos deuses com uma infindável descoberta de sensações.
Uma única batida daquele ruidoso relógio de pêndulo interrompeu aquele deleite e lembrou-nos que já eram horas do almoço.
O restaurante ficava ao dobrar da esquina. Eu só esperava que primassem pela variedade de vinhos. Percorremos vagarosamente a calçada enquanto deixávamos os nossos corações apaixonados voltar ao ritmo normal (pelo menos dentro do possível), apaziguado pela calmia do mar e revestido por aquela maresia somente interrompida pelo rebentar das ondas contra as rochas.
Ao entrar no restaurante, tudo estava na mesma, os mesmos empregados, as mesmas mesas, os mesmos petiscos, só mudava uma coisa, desta vez tinha companhia, e uma companhia que não tardei verificar que era querida por aquela gente.
-Olá João!
-Olá! – retorquiu
De todos os lados saltaram saudações, do bar, da porta da cozinha entreaberta e mesmo de algumas mesas.
As palavras da D. Maria reconfortaram-me:
- Finalmente trazes companhia, já não era sem tempo. Cuide bem dele menina – disse sem desviar o olhar atarefado dos seus petiscos
- Deixe estar que ele está em boas mãos – respondi imediatamente enquanto redobrava a força com que lhe agarrava o braço, no sentido de proteger a minha preciosa mercadoria.
Piérre, o tal empregado Francês trocou um discreto “shake hands”, sussurrou umas palavras em Francês e encaminhou-nos para um canto da sala onde umas escadas levavam ao segundo andar. Aquele segundo piso, muito menos povoado premia pelo requinte. As mesas escassas e enormes eram rodeadas de cadeiras de madeira trabalhada. Uma camilha simples de cor amarela precipitava-se no chão. Com vista para o mar encontrava-se um terraço rodeado de plantas e uma trepadeira que cobria uma armação em madeira que fazia sombra àquele local, lembrando a selva tropical. O aroma das plantas em flor enchia de romantismo aquele lugar. Ao transpor a porta que lhe dava acesso reparei numa mesa onde só cabiam duas pessoas.
O João num gesto de cavalheirismo que já me vinha habituando puxou-me delicadamente cadeira, sem quase ouvir o som de arrastar pelo chão e aconchegou-me à mesa. Imediatamente se sentou á minha frente, completando aquele quadro mágico.
- Nunca paras de me surpreender. Isto é lindíssimo – as palavras dispensavam-se pela minha expressão radiante.
- Tu mereces – retorquiu – pelo menos assim o espero – completou com uma expressão marota.
- Oh, não digas asneiras!
Piérre aproximou-se de nós com uma sapateira e camarões.
- Parra beberr? – Perguntou
Um…-ia o João pedir quando o interrompi:
- Gloria Otero tem?
Não sei mas posso perguntarr. Senão?
- Soalheiro – manifestou-se o João, é o mais antigo alvarinho de Melgaço, desde 1982- justificou.
O empregado afastou-se enquanto o João me lançava um olhar penetrante como se estivesse a sondar a mente, estupefacto com a minha ousadia.
- Então, as mulheres também podem ser apreciadoras de vinho ou não?
- Estou espantado, mas porquê o Gloria Otero?
- Já vais ver.
Quando o vinho chegou à mesa o empregado serviu o vinho a provar ao João e esperou. Quando ele assentiu distribuiu o néctar pelos copos até à medida que aconselha as regras de etiqueta. Quando pousou a garrafa o João ficou a ver aquele rótulo futurista que denunciava aquele ser um produtor recente da casta alvarinho. Peguei na garrafa e escrevi no telemóvel o nome do produtor enquanto João me acompanhava com o olhar.
- Para que queres isso perguntou?
- Então não queres bilhetes para o jogo?
- Comprei um telemóvel novo para estas férias e não tenho o número de ninguém a não ser o da minha amiga Carla. Mas tenho um amigo que é benfiquista ferrenho com uns contactos no clube.
- E que produz Gloria Otero? – completou o João com olhar entusiasmado
- De certo modo – respondi, ajuda o pai a produzir e esse é o nome que eu não sabia. Agora é só procurar o número na lista telefónica.

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