segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

Capitulo II (G)

O ladrão continuava imóvel estendido no chão, à espera do que viria a acontecer. A polícia chegou entretanto e tomou conta da ocorrência. Fui obrigada a deslocar-me ao posto mais próximo e prestar declarações do sucedido. Ao fim de uma hora, e na posse dos meus pertences saí, estafada, da sala de depoimentos. Cá fora esperava-me João cabisbaixo, muito provavelmente já desesperado pela demora das inquirições.
- “Então?” – perguntou ele.
- “Quem espera desespera!” – Exclamei.
- “Ou sempre alcança! “– Respondeu imediatamente. Percebi claramente o que ele quis dizer e devolvi um sorriso de cumplicidade.
- “ Mas como correu?” – perguntou novamente?
- “Normal. Agora o processo seguirá os seus trâmites normais”. – a frase surgiu naturalmente, mas pareceu demasiado técnica e gerou surpresa do outro lado e certamente daria azo a novas perguntas, não fora o meu rápido desviar da conversa.
- “Bem, não interessa mais? O ladrão vai preso, eu recuperei a minha mala por isso acabou tudo em bem! Almoçamos?”
- João não muito convencido assentiu com a cabeça, e com o olhar que agora brilhava mais do que nunca.
Saímos do posto e o sol batia mais quente do que o normal. Passava pouco mais das duas e o meu estômago voltava a dar sinal de si.
- “Onde vamos?” – perguntei eu.
- Não sei. Tem alguma preferência?
- Não me trates por você João. Faz-me sentir mais velha e afinal somos praticamente da mesma idade não? Ok eu sou mais velha um pouco, mas nada que te impeça de me tratares por tu.
-Teria todo gosto. Acontece que nem sequer sei o seu, quer dizer o teu nome! – Afirmou ironicamente.
- Tens razão então façamos as apresentações correctamente. - O meu nome é Margarida Moreira, muito gosto! – Exclamei apertando simultaneamente a mãe do meu novo amigo.
- Eu sou o João Rodrigo Almeida encantado!
O diálogo parecia-me saído de um filme de época, e o espaço onde outrora os grandes burgueses de Sintra passeavam, aproveitando o eléctrico que ainda hoje funciona e ligavam a montanha ao mar, apelava a esta maior formalidade.
Era inegável que o João despertou em mim um sentimento diferente. Uma paixão platónica que há muito teimava em não aparecer. A sua beleza ajudava e a carência que sentia também.
- Margarida, agora vamos almoçar, aproveitamos para nos conhecermos melhor porque para já só sei o teu nome – e fez questão de sublinhar o pronome pessoal teu, sorrindo e demonstrando que a partir daquele momento a proximidade entre nós só poderia aumentar – e que és do Porto…
E com esta frase inacabada terminou confiante de que me teria surpreendido e de facto surpreendeu.
- Do Porto? Como é que sabes? – Perguntei.
- É impossível não descobrir. O teu sotaque denuncia qualquer um, sorrindo de forma sarcástica,
- Pois olha que o teu também não. Aposto que és um alfacinha de gema – devolvendo o mesmo sorriso.
- “Pois parece que acertamos os dois” - afirmou João.
- Parece que sim disse – sorrindo.
Tínhamos vindo a caminhar lentamente desde o posto da polícia e estávamos agora já bem perto da minha casa. Sugeri que fossemos lá almoçar…

Sem comentários: